29 de agosto de 2010

Lançamento no Sarau do Binho

Publicado no blog do Sarau do Binho

LANÇAMENTO DO LIVRO "A RAINHA DO CINE ROMA" DE ALEJANDRO REYES

Nesta segunda 30-08-10 teremos a presença do escritor Mexicano Alejandro Reyes para lançamento de seu livro " A RAINHA DO CINE ROMA".



A Editora LeYa lança em agosto “A Rainha do Cine Roma”, o primeiro romance do jornalista e escritor Alejandro Reyes. Uma comovente e fascinante história, que brilhou entre os finalistas do Prêmio LeYa em 2008 - evento que homenageia e estimula a produção de obras originais de ficção em língua portuguesa.

“A Rainha do Cine Roma” traz a história de Maria Aparecida e Betinho, duas crianças que se conhecem nas ruas de Salvador e que, unidas pelo sofrimento e pela amizade, atravessam os duros dias de uma vida de abandono.

A narrativa do livro é feita em primeira pessoa, na figura do personagem Betinho: morador de rua desde os sete anos - sobrevivendo de pequenos furtos e michês - fugiu de casa para escapar da violência imposta por seu padrasto. Vagava pelas ruas da Cidade Baixa, sempre sozinho, até se deparar com Maria Aparecida, uma pequenina e frágil garota de dez anos, que sofre uma drástica mudança na vida após a morte da mãe e decide fugir de casa.

Vítimas de abusos por parte dos pais, Maria Aparecida e Betinho passam a viver em um cinema abandonado: o Cine Roma. E, apesar de todo o suplicio que lhes é imposto, os dois constroem um forte laço capaz de resistir a tudo.

Reflexões sobre temas negligenciados pela sociedade, como abuso sexual, drogas, homossexualidade, AIDS, prostituição, preconceito racial, violência física e o abandono, estão presentes nas 296 páginas do livro. Chama atenção dos leitores para um universo sujo e cruel, que é imposto àqueles que estão, desde muito cedo, às margens da sociedade.

É uma bela história sobre a esperança de duas crianças, maltratadas pela vida e pela circunstância, mas que nunca deixaram de acreditar que, um dia, poderiam ser amadas de verdade.

“Surpreendente e intenso, terno e violento, A Rainha do Cine Roma é mais do que um romance para leitores exigentes: é um verdadeiro hino à vida”. José Manuel Saraiva

“Quem tiver peito fraco, é melhor não tocar neste livro. Porque ele é duro, cru, verdadeiro. No entanto, no fim fica um fiozinho de açúcar, emoldurando uma réstia de esperança.” Pepetela, escritor e membro do júri do Prêmio Leya


O Autor

Alejandro Reyes nasceu na cidade do México, é jornalista e escritor. Depois de viver alguns anos nos Estados Unidos e na França, mudou-se para o Brasil, onde fez trabalho social com crianças e adolescentes de rua. É mestre em Estudos Latino-Americanos pela Universidade da Califórnia e doutorando em Literatura Latino-Americana, cuja tese incide sobre a literatura marginal.

21 de agosto de 2010

Narrativa do corpo e da fala

Publicado em O Estado de São Paulo

por Wilson Alves Bezerra

Saber como fala um personagem é haver descoberto um destino, dizia Jorge Luis Borges. A constatação é uma boa chave para ler o romance de estreia do mexicano Alejandro Reyes, A Rainha do Cine Roma, escrito em português. Houve um tempo em que 'dar voz' a personagens marginalizados implicava uma espécie de reconstrução fônica da fala que contrastava com a língua bem falada do narrador, em terceira pessoa, o 'estilo esquizofrênico', na definição de Antonio Candido. Aqui, a estratégia é outra: aquele que fala, e escreve, faz parte da história narrada - Betinho, um moleque de rua já crescido, que conta sua infância e adolescência em Salvador, dá voz à narrativa.

Para os leitores do Brasil, essa voz tem sabor exótico: a cadência de oralidade proposta, além do registro da fala nordestina, traz elementos da sintaxe do espanhol - língua materna do autor -, resultando em expressões algo inesperadas ('morrer feita churrasco', por exemplo). A impressão é a de uma língua inventada, que lhe rendeu o segundo lugar no prêmio do grupo português LeYa, em 2008.

O maior mérito do livro é a reconstrução testemunhal da vida de rua do pequeno grupo de crianças nordestinas enjeitadas: do momento de sua saída, ainda na infância, da casa familiar à inserção no meio marginal. A narrativa de Reyes privilegia as dificuldades de sociabilidade das crianças no meio inóspito no qual contam, antes de tudo, com o próprio corpo como meio de sobrevivência e subsistência: na mendicância, nas lutas e na prostituição. O sexo surge ainda na infância, sob a forma de abuso do pai ou padrasto, e se torna a forma privilegiada de oferecer-se aos olhos do outro - adulto, estrangeiro, bem-sucedido - disposto a gozar (em todos os sentidos) de um corpo disponível, e dar a ele algum estatuto no grupo social. O próprio narrador se compraz, em alguns momentos, em colocar o leitor na condição de voyeur.

Nesse sentido, o livro é a narrativa dos corpos, nas diversas descrições de atos sexuais, incestuosos, homossexuais, grupais. Um dos personagens principais da trama é ele próprio um travesti, que procura na metamorfose física uma sorte de identificação consigo mesmo, completude e reconhecimento exterior, nunca encontrados. Interessante o Brasil marginal visto por este olhar, que recusa a síntese, e falado por vozes vacilantes, de destino incerto.

WILSON ALVES-BEZERRA É PROFESSOR DO DEPARTAMENTE DE LETRAS DA UFSCAR, TRADUTOR E AUTOR DE REVERBERAÇÕES DA FRONTEIRA EM HORACIO QUIROGA (HUMANITAS/FAPESP)